Nesse tempo de Quaresma já afirmamos a Pecaminosidade da criação caída, que a tudo, a todos e a todas as áreas atingiu no que o reformador João Calvino denomina, apropriadamente, de “depravação total”. O Pecado (maiúscula, singular) é o estado existencial básico causa dos pecados (minúscula, plural) como suas manifestações concretas e particulares, individuais e sociais/institucionais. Apesar de que cada cultura nacional ou regional e cada subcultura religiosa tenha, formal ou informalmente, criado categorias de pecados (“mortais” vs. “veniais”), tal valoração não encontra respaldo bíblico.
Ao Pecado se obtém a reação da Ira de Deus: a indignação contra o mal por parte de um Deus Santo.
Deus não quer que ninguém se perca e quer restaurar a Sua criação, visando a plenitude do Seu Reino. Há um caminho de volta, de retorno, de recomposição, de reconciliação, que passa, preliminarmente, por um requisito inegociável: o Arrependimento.
Os Profetas, levantados e inspirados por Deus, pregaram a mensagem de arrependimento às pessoas e aos povos. João, o batista, pregou a mensagem de arrependimento. Pedro respondeu aos novos convertidos no Dia do Pentecostes, que a primeira coisa que eles tinham de fazer era se arrepender.
Arrependimento não é um vago sentimento de culpa, um remorso, de fundo emocional, sem maiores consequências, podendo ser superado por exercício de catarse. Arrependimento é algo profundo e vindo do alto, existencialmente significativo. O arrependimento eficaz produz mudanças. Não há perdão sem arrependimento.
As lamentáveis controvérsias teológicas do início do século XX nos Estados Unidos (fundamentalismo vs. liberalismo; criacionismo vs. evolucionismo; evangelho individual vs. evangelho social), fragmentaram e parcializaram o conteúdo da mensagem, atingindo – mais ou menos – todos os segmentos ortodoxos protestantes norte-americanos, com desdobramentos trágicos para a saúde e a missão da Igreja. As Igrejas Orientais, a Igreja de Roma e o Protestantismo Europeu, por seu lado, foram minimamente afetados. O conceito de pecado social/institucional exige, também, um arrependimento de coletividades, como pretendeu Jonas em relação à Nínive (p.ex.).
Para que haja o necessário arrependimento, temos que ter quem anuncie a realidade do pecado e a sua exigência. E aqui entra a exposição da Lei. É evidente que nem o universalismo, o sacramentalismo, e o liberalismo, internamente, nem o secularismo, o multiculturalismo e o “politicamente correto” externamente, não irão nem afirmar a natureza do pecado nem a necessidade do arrependimento, como a Bíblia nos ensina. Parcelas do conservadorismo protestante irão apenas fazê-lo ao nível individual, silentes no social/institucional, e os liberais farão o oposto.
Há um Arrependimento (maiúscula, singular) na nossa conversão e decisão de receber a Cristo como Salvador e a segui-lo como Senhor, e arrependimentos (minúscula, plural), dos males do nosso cotidiano de falhas, todos movidos pela ação do Espírito Santo.
Arrependei-vos! Arrependamo-nos!
O nosso Rito II de Quarta-feira de Cinzas, início da quaresma, diz: “Sentimo-nos envergonhados, tristes e arrependidos dos nossos pecados”. E: “Deus nosso Pai, tu criaste-nos do pó da terra; concede que estas cinzas sejam para nós lembrança da nossa mortalidade e sinal da necessidade de arrependimento...” (LOCb).
+Dom Robinson Cavalcanti, ose
Bispo Diocesano
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