quinta-feira, 3 de março de 2011

Exorcismo – Reflexões Sobre o Filme “O Ritual”

Ven. Arc. Rev. João Peixoto (¬)

À semelhança do Ministro Local Elton Roney, que recentemente socializou um artigo (“Sombras do Divino: Da Teologia Anônima à Teologia Cristã”) em que confessa ser um admirador da sétima arte, o cinema, confesso que também tenho a mesma admiração.

Ao tecer comentários, tendo como “mote” de sua abordagem o filme “O exorcismo de Emily Rose”, também aproveito para compartilhar algumas impressões sobre o filme “O Ritual”, tendo como um dos protagonistas o talentoso Anthony Hopkins, ainda em exibição em algumas cidades.

Além do medo que muitas pessoas demonstravam na sala de cinema, com cada cena mais empolgante, três coisas me chamaram a atenção:
a) o ceticismo de um seminarista que precisou “ver para crer” na existência de Deus e do diabo;
b) o apego aos rituais / ritos / instrumentos como necessários à prática do exorcismo;
c) a possessão demoníaca do exorcista.

Não por vocação, mas apenas para se livrar do pai e ter uma justificativa para sair de casa é que o seminarista Michael ingressa no seminário e faz todo o seu curso, que em nada contribui para despertar a sua fé.

Como Tomé, ele precisou ver para crer. No caso da personagem, para crer em Jesus, e mais, também precisou ver para crer na existência do mal que se apossa da vida de pessoas. Que bom que a experiência de ver e participar de um autêntico exorcismo abriu os seus olhos, seu coração e sua vida para entregar-se ao Senhor Nosso.

Mas, ao mesmo tempo, lamentava por muitos que vivem buscando uma experiência sobrenatural para enfim, crer em Deus, não sendo mais suficiente a Palavra revelada e pregada, a Sua revelação pelas obras da criação, nem a transformação operada e testemunhada na vida de muitas pessoas. Tomé sustentou sua incredulidade na ressurreição de Cristo por seis dias apesar do testemunho dos apóstolos e discípulos. Michael sustentou sua incredulidade por toda a sua vida, até então, apesar de tantas evidências da existência de Deus.

Todos nós devemos buscar uma experiência com Deus, mas isto não implica, necessariamente, em momentos cinematográficos. Pior, muitos que têm tal “experiência” dela ficam dependentes sempre buscando novidades da manifestação divina em suas vidas.  “Bem-aventurados os que não viram, e creram” (Jo 20.29). Sem termos visto, acreditamos que  Jesus que está no nosso meio e somos muito felizes por isto.

Quanto ao apego aos rituais, ritos e instrumentos entendo como recursos auxiliares, não necessariamente fundamentais. O filme mostra um excessivo apego em se mostrar objetos sagrados (cruz, p.ex.), água benta, sinal da cruz, leituras bíblicas, etc. O rito de exorcismo existente em nossa Diocese, traduzido do LOC chileno, até se utiliza de muitas destas práticas e gestuais, mas é muito feliz em nos alertar que “...não tem a pretensão de ser uma Liturgia precisa para qualquer ocasião, mas um exemplo com sugestões, dando certas normas quanto a ordem e o modo de atuação”.

Além disso, tem o cuidado de nos mostrar o respaldo desta prática e a fonte de autoridade para assim proceder:

“Cristo, por sua natureza divina e por seu sacrifício vitorioso na cruz, tem todo poder e autoridade para dominar os demônios e espíritos malignos. Ele conferiu esta autoridade à sua Igreja, de modo que todos os que têm fé em Cristo compartilham dela”.

Em síntese, a fé em Jesus e em seu poder credencia a igreja a exercitar a autoridade sobre espíritos imundos. Ritos, instrumentos e gestos, serão bem vindos como auxiliares.

Por fim, a questão mais intrigante: o experiente padre exorcista foi possuído pelo demônio. Isto é possível? Já ouvi comentários que o grande pecado do padre foi acreditar que o poder do demônio era maior que o de Deus para expulsá-lo, pecado este sentido por ele, mas não confessado, daí a sua fraqueza e abertura para sua possessão. Não é meu objetivo aprofundar a questão, já que outros mais doutos podem fazê-lo, mas trazer à reflexão as advertências contidas no evangelho:


“Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? e em teu nome não expulsamos demônios? e em teu nome não fizemos muitas maravilhas? E então lhes direi abertamente: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade” (Mateus 7.21-23).

Ser religioso, ser ativo na igreja, até mesmo ter um cargo pastoral não é garantia de acesso ao reino dos céus. Práticas exteriores não se sobrepõem à necessária conversão interior que se traduz em mudanças exteriores legítimas e não hipócritas. Quantos “prodígios, maravilhas e sinais” têm sido demonstrados por tantos líderes espirituais da moda e que bem poderão retratar a passagem bíblica acima citada. E nós? Podemos dizer “Senhor, Senhor” sem nos atemorizar quanto ao nosso futuro? Pensemos nisto!

Para quem não assistiu ao filme, recomendo. Deus vos abençoe!


¬ Rev. João Peixoto de Siqueira Filho é Presbítero na Diocese do Recife; Coadjutor da Paróquia Anglicana Emanuel, em Olinda-PE e Arcediago Norte da Diocese.
Secretaria Episcopal
Diocese do Recife - Comunhão Anglicana
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